Prefiro o desequilíbrio lúcido
a revirar sentimentos calados
fazendo barulho para manter-me viva.
A seguir outro compasso
na contradança da vida,
que contraria e impede a valsa.
Prefiro perder-me de vista
e reencontrar-me nova,
onde se entremeia a pista
que, a todo instante, se renova
no salve-se quem puder
e salvarem-se todos,
entre mortos e feridos.
Prefiro atalhos cerzidos,
remendados um a um,
à reconstrução de caminhos
que não levam a caminho algum.
Entrego-me ao inesperado,
ao sonho inusitado,
às contradições do dia,
à luz de cada manhã,
à espera compulsória,
ilusória,
alienada ao mistério não revelado
da incerteza do amanhã.
Prefiro-me a mim,
como sou, assim,
(in)lucidez que vibra
a cada lampejo do sol,
com as miudezas da rua,
com as voltas do girassol,
com a nova fase da lua.
jun 04 2021
(In)lucidez!
jun 04 2021
Súplica!
Impede-me!
Tira-me o chão,
o rumo,
a direção.
Corta minhas asas,
impede-me de voar!
Arrebata-me os sonhos,
meu direito de sonhar.
Veda-me os olhos:
“O que os olhos não veem,
o coração não sente.”
Mas pressente!
Lacra-me o sorriso.
Sorrirei com a alma,
com a mente.
Escreve meu destino,
registra-o
em teu pergaminho.
Cerca meus caminhos,
obstrui meu caminhar.
Excita-me a sede,
mostra-me a fonte a jorrar.
Aprisiona meus sentimentos,
em catarse virão me encontrar.
Cala meus pensamentos:
juntos não vão dispersar.
Sequestra minha identidade,
tudo o que há entre mim e mim.
Anuncia meu fim.
Contudo jamais roubarás
o amor que me faz assim.
jun 04 2021
Versos!
Trago na boca sabor de sol,
calor incessante a aquecer o sonho.
No olhar, a luz jorrada pelo arrebol,
acesa pela esperança de um porvir risonho.
Na garganta, a voz rouca de quem silencia
o brado resguardado a esperar pelo dia
de se fazer ouvir o que a alma fala.
Trago nas mãos a calosidade da lida,
missão por hora cumprida,
o que me reservou a vida,
simples guarida,
acervo de minhas rimas e composições,
palavras recolhidas de minhas emoções
levando-me onde bem quero,
onde almejo e espero
a realização dos sonhos.
Trago na alma a lágrima do inocente
que, ao se calar, consente,
a culpa que jamais foi sua,
julgado a revel,
justiça incomplacente,
verdade inconveniente,
injustiça a prevalecer,
e o culpado jamais castigado.
Minha impotência em só descrever
fragilidades em estrofes e versos
captadas de um mundo adverso
talvez possa ir além de escrever:
um dia toque o ser insensível
e quem sabe fale ao coração de alguém.
jun 04 2021
Causa Mortis!
A lágrima já não chora,
seca ou deixa de nascer,
o riso perde a graça
não há razão de ser.
A dor se fecha em silêncio,
não mais vigora,
cansa de doer.
O verso que antes sorria
e atrevia a inspiração,
de morte quer se prover.
A arte nobre do artista
passa a ser vista
sem admiração.
A sensibilidade,
mãe que gera a verdade,
vira insensibilidade.
O ar rarefeito
impenetra o peito,
defronta o pulmão,
não há mais efeito,
ação, reação.
Não há coração.
Banaliza-se a essência,
de carência o amor se faz,
o homem sem consciência,
petrificado jaz.
Perde-se a ternura
no cais da desventura,
em portos que não se veem mais
a brandura dos abraços,
a tristeza dos jamais.
Auroras perdem belezas,
horizontes embromam linhas,
a morte peregrina,
a vida se desfaz.
jun 04 2021
Navegante!
Navega, pensamento:
cruza os mares,
enfrenta as marés,
acalma a turbulência,
germina os ares
da mais pura essência.
Desperta os sonhos
que geram resplandecência.
Junta-te a eles,
percorre a luz,
inebria-te da luminosidade.
Perde-te nesse clarão,
fecunda-te de significados,
percorre o infinito
alheio ao sol eclipsado,
ignora a escuridão.
Cresce seguindo sempre
a melhor direção.
Navega, pensamento:
não temas as calmarias.
Insiste em teu intento
mesmo que não haja vento,
ainda que na contramão do tempo.
Iça as velas do teu barco,
vive esse momento,
peregrino bardo.
És livre,
podes seguir em frente,
alcança o teu desejo,
tu, que podes navegar,
busca o teu ensejo,
realiza os sonhos
que eu sempre quis realizar.
Vai, adentra as brumas do oceano,
desvenda-lhe os mistérios,
arranca-lhe os panos,
envereda-te em seus encantos
reais e surreais,
constrói os teus castelos,
povoa-os de ideais
e volta para me buscar.
abr 13 2021
Estratagemas (a vida em ão)
Perco o chão
prendo a respiração
ouço meu coração.
Vibro de emoção,
morro de paixão,
transbordo excitação.
Canto uma canção,
toco um violão.
Digo sim e não
qualquer que seja a razão.
Fico na solidão
só, na imensidão.
Grito um palavrão
em prol da libertação.
Saio da prisão:
o sol embaça a visão
habituada à escuridão.
Olho para a multidão
andando sem direção.
Arrisco uma reflexão,
faço uma confissão,
entrego-me à oração,
me doo à conversão,
me agarro à religião,
libero a devoção
sem noção ou pretensão.
Discuto a relação:
eterna procura de solução.
já tenho o não.
Quem sabe um sim, então.
Por que não?
Procuro temas,
estratagemas,
cenas
isentas ou não de problemas,
obscenas ou serenas,
profundas ou amenas.
Enfim, busco da vida
o poema.
abr 13 2021
Lembranças!
Trago nas mãos,
uma colcha de esperas.
Um querer feito de silêncios,
alimentando orvalhos.
Guardo nos bolsos,
retalhos das manhãs,
que recolhi,
na vã ilusão de viver um dia.
Carrego na alma,
palavras inaudíveis
que talvez nunca sejam ditas.
Trago nas mãos,
gestos tão ternos,
impossíveis de serem traduzidos.
abr 13 2021
Labirintos!
Às vezes me perco,
nesse labirinto de mim.
Procuro nas curvas,
nas esquinas,
nos cantinhos
escondidos da alma
por momentos
que me tragam a calma,
que me devolvam
a leveza dos dias.
Procuro e procuro
e, enquanto vasculho,
busco a magia.
Levo estrelas nos olhos
e olho por todo lado.
Ilumino o caminho
com o verde esperança,
da relva macia,
das folhas e ramos,
do lume dos pirilampos,
e sinto que me encontro
nesse meu labirinto.
É só olhar para dentro e ver
o que apenas eu sei
o que apenas eu sinto.
E sei
onde tudo se esconde,
onde começa
e por onde andei,
até onde quero que vá,
por onde quer que eu ande.
Pois sou o início,
sou a estrada
e o olhar.
Sou o caminhar sem pressa,
sou o trajeto que escolho,
sou a próxima parada
onde me recolho
e me encontro.
E, por fim,
sou o destino de mim.
abr 13 2021
Campo de Girassóis!
Eu quero
um campo de girassóis
para abrigar esse amor,
para não sermos dor
e para nunca mais
sermos sós.
Eu quero
a suavidade dos girassóis,
para sentir o toque,
o teu beijar de calma,
da tua alma na minha.
Eu quero
o encanto dos girassóis,
para saber da magia
e, à tarde,
na tua luminosidade,
me esconder.
Eu quero
a claridade dos girassóis,
que é para sermos sol,
que é para sermos nós.
Quero
minha alegria de viver
e, ao nublar dos dias,
quero ser
um olhar dentro
desse nosso olhar,
em direção a um campo de girassóis.
abr 13 2021
Certeza!
Haja o que houver,
estarei aqui.
Nas fendas do tempo,
no itinerário do vento,
nos confins do mundo,
nas sendas do destino,
no desatino dos dias,
na quietude das noites
da minha solitude
e haja o que houver
espero por ti.
Estarei aqui,
onde o sol nasce
e onde se esconde.
Estarei
no murmúrio do mar,
no mergulho da garça,
na algazarra da praça,
no barulho da chuva,
no cheiro da terra molhada,
na infinita estrada
que te traz a mim.
Estarei
no voo rasante do pássaro,
na corrente mansa do rio,
no calor e no frio do teu corpo,
na dança das folhas na tua janela,
no ramo que o canário traz
para fazer o ninho.
Na coreografia silente
dos peixinhos no aquário,
no teu cantinho:
Templo sagrado,
teu relicário
onde encontras paz.
Estarei
em tudo o que existe,
em tudo o que fazes,
em tudo o que sentes,
pois habito em ti.
E tu estarás
em tudo o que quero,
em tudo o que espero:
és o melhor de mim.
Não quero que fiques triste:
haja o que houver,
estarei aqui.
Nas fendas do tempo,
no itinerário do vento,
nos confins do mundo,
nas sendas do destino,
no desatino dos dias,
na quietude das noites da minha solitude
e haja o que houver
espero por ti.
Porque em mim tu estás.